Sua Excelência o Chefe do Executivo
Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa
Ex.mo Senhor Presidente do Tribunal de Última Instância
Ex.ma Senhora Secretária para a Administração e Justiça
Ex.mo Senhor Presidente da Comissão Independente Responsável pela Indigitação dos Candidatos ao Cargo de Juiz
Ex.mo Senhor Presidente da Associação dos Advogados de Macau
Ilustres convidados e amigos dos sectores judicial e jurídico
Senhoras e Senhores
Antes de mais, gostaria de expressar a todos os convidados e em nome do Ministério Público, as boas vindas pela vossa presença na Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário 2018/2019, presidida por Sua Excelência o Chefe do Executivo. Por esta ocasião, iremos fazer uma retrospectiva sucinta do funcionamento do Ministério Público no ano judiciário transacto e ao mesmo tempo resumir as experiências e perspectivar o futuro, salvaguardando, juntamente com outros sectores da sociedade, o Estado de direito, enquanto valor nuclear da vida social da Região Administrativa Especial de Macau.
No ano judiciário 2017/2018, foram autuados 14.517 inquéritos, o que representa uma diminuição de cerca de 1%, comparando com os 14.655 inquéritos autuados no ano judiciário anterior; foram tramitados 834 processos laborais, o que representa uma subida de cerca de 3%, face aos 810 do ano judiciário anterior; foram instaurados 649 processos civis e 1.063 processos administrativos internos pré-processuais em matéria civil, tendo sido concluídos 1.312 processos desta natureza; em relação às acções penais que constituem o principal exercício do Ministério Público, dos 14.816 inquéritos concluídos no ano judiciário transacto, foram deduzidas 4.334 acusações e proferidos 10.175 despachos de arquivamento, após a investigação; dos processos tramitados pelo Serviço do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo, foram apresentados 3.651 vistas, articulados ou requerimentos.
Paralelamente, à medida que têm aumentado os processos instaurados e findos do Tribunal Judicial de Base, tem sido registado um acréscimo gradual dos recursos aos Tribunais de Segunda e Última Instâncias nos últimos anos. No ano judiciário transacto, foram recebidos pelo Serviço do Ministério Público, 1221 processos de várias espécies, junto do Tribunal de Segunda Instância, e, 115, junto do tribunal de Última Instância.
Apesar do grande volume de processos, conseguiu-se, no ano judiciário findo, através dos esforços conjuntos de todos os trabalhadores do Ministério Público, um progresso na qualidade e eficiência da sua tramitação. Assim, por ocasião desta Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário, permitam-me endereçar os sinceros agradecimentos a todos os magistrados, oficiais de justiça e funcionários do Gabinete do Procurador pelo seu trabalho, dedicação e esforço.
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Analisados os dados resultantes da tramitação de processos, entendemos que merecem a nossa atenção os seguintes pontos:
1. Apesar de ser relativamente estável a situação de segurança da RAEM, verifica-se um aumento na autuação de crimes contra o património.
Segundo os dados referentes aos inquéritos autuados, registou-se, no último ano judiciário, a diminuição da criminalidade violenta em Macau, tal como os crimes de homicídio doloso, de ofensa grave à integridade física e de ofensa qualificada à integridade física; os crimes de sequestro reduziram cerca de 27%; foi similar a taxa de incidência do crime de furto e do crime de roubo, em comparação com o ano judiciário anterior; porém, foram autuados 1.178 inquéritos de burla, com um acréscimo de 301 face aos do ano judiciário anterior, não obstante, entre esses inquéritos, a diminuição dos crimes de burla telefónica para 141; em simultâneo, os crimes de falsificação de documento aumentaram para 405, havendo um acréscimo de 146 quando comparado com o ano judiciário anterior.
Ainda, devido à ganância, deixou-se de participar à polícia o que foi achado, nomeadamente, apropriação de quantias deixadas por outra pessoa em máquinas de caixa automática, que não foram levantadas por esquecimento, e apropriação de bens deixados por passageiros nos meios de transporte público, resultando daí a violação da lei penal, com um acréscimo dos 339 inquéritos, atingindo 1.601, situação essa que deverá ser objecto de atenção.
No tocante aos crimes relacionados com a droga, foram autuados 209 inquéritos, o que representa uma diminuição de 44 em comparação com o ano judiciário anterior.
Foram autuados 138 inquéritos de casamentos simulados, registando-se uma descida de 37 relativamente ao ano judiciário anterior.
No que respeita ao crime de importunação sexual, que foi legislado na segunda metade do ano 2017, verificaram-se 49 inquéritos autuados, o que se traduz na elevação constante da consciência da sociedade quanto à resposta ao comportamento de importunação sexual com a sanção penal.
Os dados supracitados representam uma maior estabilidade da situação de segurança de Macau. Contudo, no passado ano judiciário, verificou-se uma subida dos crimes contra o património, pelo que, no sentido de salvaguardar a segurança patrimonial dos cidadãos, prevenindo que os criminosos aproveitem a oportunidade para a prática de crimes, os cidadãos também precisam de ficar mais atentos e tomar precauções, à medida que se reforçam o combate a esses crimes e as respectivas acções de sensibilização e educação.
2. A taxa de ocorrência de crimes de branqueamento de capitais está basicamente sob controlo
Nos anos judiciários de 2014/2015 e 2016/2017, o número de autuação de crimes de branqueamento de capitais aumentou, apesar de ser relativamente baixo o número de acusações.
No entanto, ao analisarmos as circunstâncias da ocorrência desses factos, verifica-se um número crescente dos casos de levantamento de quantias avultadas, com cartão de débito do Interior da China, em máquinas de caixa automática, durante o período acima referido. Com vista a apurar a existência do eventual acto criminoso, o Ministério Público instaurou inquéritos com base nos relatórios de transacções suspeitas recebidos, que mais tarde arquivou, uma vez que essas transacções não constituíam crime, mas sim, casos de fuga ao controle cambial exercido no local de origem de fundos. Por outro lado, na sequência de ter sido reforçada a gestão do procedimento de levantamento com cartão de débito do Interior da China pelos respectivos departamentos governamentais responsáveis pela gestão financeira, no ano judiciário transacto, foram autuados apenas 48 crimes de branqueamento de capitais, reduzindo-se 59, situação essa que voltou a equiparar-se ao que acontecia antes do ano de 2014.
3. Da execução da Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica
Tratando-se dum elemento fundamental da composição social, o lar, e cujos membros familiares vivam em harmonia, tal contribui para o bem-estar geral da sociedade. Na sequência da entrada em vigor da Lei de Prevenção e Combate à Violência Doméstica, desde Outubro de 2016, o Ministério Público tem promovido a cooperação estreita com os órgãos relacionados com a assistência social e os de polícia, de modo a impulsionar o procedimento judicial através da investigação criminal e aumentar a salvaguarda dos ofendidos sob o regime de protecção social. Em simultâneo, o Ministério Público, continua a trabalhar na revisão da execução da Lei em causa sob o ponto da vista de órgão judiciário, tendo por objectivo reforçar a prevenção e a repressão da violência doméstica, daí que cultive, em conjunto, a paz quer na família quer na sociedade.
4. Acréscimo dos processos de natureza administrativa pendentes
No ano judiciário transacto, o Serviço do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo precisou de acompanhar 1.760 processos diversos ainda não concluídos, representando um aumento de 357; foram efectuadas vistas e apresentados articulados ou requerimentos num total de 3.651, sofrendo estes um aumento de 1.943; foram findos 125 processos, representando um aumento de 21; foram transferidos 1.539 processos para o ano judiciário seguinte, incluindo 1.239 recursos contenciosos relacionados com processo sancionatório administrativo referente à reserva de táxi on line, entre os quais, 1.050 já com liquidação das custas, aguardando o visto em correição; enquanto os restantes processos envolveram impugnação sobre a habilitação para aquisição de habitações económicas, habilitação para o arrendamento de habitações sociais, utilização de trabalhadores não-residentes fora das condições previamente autorizadas, prestação ilegal de alojamento e a cobrança de impostos. Além disso, o Serviço do Ministério Público junto dos Tribunais de Segunda e Última Instâncias, recebeu 193 processos em matéria administrativa a tramitar no Tribunal de Segunda Instância, representando um aumento de 45, em comparação com o ano judiciário anterior, e 44 processos em matéria administrativa a tramitar no Tribunal de Última Instância, sofrendo estes um aumento de 15.
Julgamos que, a subida do número de processos traduz, para além da elevação constante da consciência dos cidadãos no âmbito da defesa legal dos seus direitos, a relação entre o rápido desenvolvimento socioeconómico de Macau e o reforço de poderes públicos no ajuste dos assuntos sociais, intervindo o Ministério Público rigorosamente de acordo com os princípios da legalidade e da objectividade nos processos em matéria administrativa. Objectivamente, o resultado do julgamento desses processos produzirá efeitos positivos na promoção da legalidade administrativa.
5. Sem ignorar a segurança no trabalho
No ano judiciário transacto, foram registados 834 processos de trabalho no Serviço do Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Base, 397 dos quais se prenderam com o acidente de trabalho e doença profissional, apesar de se ter registado menos 123 processos, o seu número de instauração de processos ainda se mostra elevado.
De facto, a vida e a saúde não têm preço, pelo que a entidade patronal tem o dever de fornecer aos seus trabalhadores um ambiente e condições de trabalho com segurança, e apelamos aos trabalhadores para estes reforçarem a consciência de segurança de trabalho e cumprirem activa e rigorosamente as normas de segurança, e nunca arriscarem, de forma alguma, só porque será mais rápido e conveniente. Além disso, os órgãos fiscalizadores devem continuar a efectuar a sensibilização e monitorização efectivas, com o fim de evitar, com esforços conjuntos, nas vertentes diversas, a ocorrência de acidentes de trabalho e doença profissional, e salvaguardar a saúde, quer física, quer intelectual, dos trabalhadores.
Sua Excelência o Chefe do Executivo, Ilustres convidados,
São atribuições principais do Ministério Público, nos termos da Lei de Bases da Organização Judiciária, representar a Região Administrativa Especial de Macau em juízo, o exercício da acção penal, salvaguardar a legalidade e assumir, nos casos previstos na lei, a defesa de interesses difusos, sendo o combate ao crime assente no processo penal a tarefa primordial do Ministério Público, procurando defender a dignidade de Direito e retomar a ordem da sociedade; ao dirigir a investigação criminal, presidir ao inquérito e proferir a acusação, o Ministério Público obriga-se a assegurar, nos termos da lei, a legalidade dos procedimentos, quer no inquérito, quer no julgamento, de forma a garantir que, em sede de inquérito, nenhum caso poderá escapar de ser investigado, não incriminando o inocente, nem deixando impune o culpado.
No ano judiciário que terminou, o Ministério Público cumpriu como habitualmente, as atribuições jurisdicionais sob a forma autónoma e independente, livre de qualquer interferência nos termos da Lei de Bases da Organização Judiciária; relativamente aos actos violadores que contrariam a lei penal, o Ministério Público desenrolou, em estrita conformidade com o procedimento legal, a acção penal, independentemente do estatuto social ou ideologia, fazendo com que a prática de crime seja certamente punida.
É do nosso conhecimento que, numa sociedade moderna e diversificada onde se depara com uma grande variedade de pedidos, a legislação científica, execução rigorosa da lei e cumprimento da mesma por todos os cidadãos, para que a justiça seja mais justa, constituem os requisitos básicos de uma sociedade governada pela lei, sendo o seu cumprimento o dever básico de cada cidadão, e onde todos são iguais perante a lei, não obstante a consciência subjectiva de definir a sua conduta como algo acompanhado de conceitos morais e objectivos sublimes, não pode concretizar o seu objectivo ultrapassando a linha de base da lei e concluir arbitrariamente que os serviços de execução da lei ou as instituições judiciárias acusem determinadas infracções, apenas por perseguição política, julgamento esse que não corresponde à ideia da governação de que todos são iguais perante a lei.
De facto, para garantir os direitos e os interesses legítimos dos cidadãos, o regime jurídico da RAEM, com base na Lei Básica, assegura a qualquer cidadão o acesso ao Direito, aos Tribunais, podendo resolver os conflitos de interesses públicos e privados mediante um processo justo, imparcial, público e reprimir a violação da lei, e, paralelamente, de acordo com o disposto na Lei de Bases da Organização Judiciária, o Ministério Público participa nos processos nos termos da lei, supervisionando a legalidade dos mesmos bem como salvaguardando a independência do tribunal, garantindo, assim, que os conflitos possam ser resolvidos nos tribunais, de forma razoável e através de um procedimento justo.
O regime judiciário é a última linha de defesa para a justiça social, defendendo a integridade do sistema jurídico da RAEM construído com base na Constituição e Lei Básica e os alicerces do Estado de direito, o que faz parte das atribuições do Ministério Público. Relativamente à perspectiva do trabalho para o próximo ano judiciário 2018/2019, o Ministério Público irá aperfeiçoar o sistema de gestão dos processos informatizados e elevar a eficiência de tramitação com garantia da sua qualidade, simultaneamente, para que os cidadãos sintam que o trabalho judiciário tem como objectivo a procura da justiça, cumprindo rigorosamente as funções sublimes do Ministério Público como defensor do primado da lei da RAEM.
Sua Excelência o Chefe do Executivo, permita-me, antes de terminar o meu discurso, partilhar com todos os magistrados uma história sobre a lápide onde foi registada a lista de Governantes de Kaifeng, incluindo o Governador Baozheng. Na lápide, conservada, como a peça mais importante, no Museu da Cidade de Kaifeng, na Província de Henan, foi registada a lista dos 183 Governantes de Kaifeng durante o período de 146 anos, ou seja, desde o primeiro ano da era Jianlong, período do Imperador Song Taizu (no ano de 960) até ao quarto ano da era Chongleng, período do Imperador Song Huizong (no ano de 1105), de entre os quais são incluídos alguns políticos e literatos famosos e por todos nós conhecidos, nomeadamente, Fan Zhongyan, Cai Xiang, Baozheng e Ouyang Xiu. Olhando para a longa história de civilização do povo chinês, este modo de registo surgiu já na Dinastia Jin Ocidental, tornando-se mais popular a partir da Dinastia Song do Norte. O registo do nome, cargo, datas de início e de termo de funções como autoridades, tinha como objectivo fazer-lhes sentir a honra e o peso da responsabilidade pelo cargo que assumiam. Como que dizendo Sima Guang na sua obra “Registo de Nomes de Conselheiros”, tal registo, assumindo uma função de sensibilização para a ética na sociedade, permitia ao povo apontar e tocar em cada um dos nomes de autoridades esculpidos, comentando e dizendo quem era leal, quem era malicioso, quem era honesto e quem era desonesto. Todavia, entre os 183 nomes de Governantes esculpidos na referida lápide, verifica-se uma ranhura larga e profunda no meio da terceira linha na lápide, lugar onde devia ser esculpido o nome de Baozheng, tendo sido identificada apenas a frase seguinte: “assumiu o cargo de Zhi Xue Shi de Long Tu Ge e exerceu a função como Governador interino, em Março do segundo ano”. De acordo com a justificação referida na Poligrafia Gui Xin, da autoria de Zhoumi que viveu no final da Dinastia Song e no início da Dinastia Yuan, a ranhura larga e profunda devia-se ao facto de que o povo tocava frequentemente no nome de Baozheng, esculpido na lápide em causa, isto é, ao longo dos séculos, ao visitarem a lápide, os visitantes, pelo respeito e saudades que tinham sobre Baozheng, gostavam de tocar no seu nome esculpido. Assim, com o passar do tempo, o nome dele esculpido foi desaparecendo. Face à imparcialidade e integridade de Baozheng, espero e creio que todos os magistrados do Ministério Público da RAEM tenham presente o seguinte: “não podem deixar de ser insistentes pelo facto de a vossa responsabilidade ser pesada e duradoura”, sem se esquecerem dos seus propósitos originais que os levaram a ingressar nessa carreira, conquistando a confiança e apoio dos cidadãos com a imparcialidade judiciária.
Nesta sessão solene de abertura do ano judiciário, o Ministério Público gostaria de aproveitar esta oportunidade para endereçar agradecimentos sinceros ao Governo da RAEM e aos diversos sectores sociais que têm apoiado e prestado atenção ao trabalho do Ministério Público, especialmente, aos órgãos de polícia que têm auxiliado o cumprimento das atribuições do Ministério Público.
O Ministério Público exprime a sua gratidão aos colegas na área judicial e advogados que participam no trabalho judicial.
Para finalizar, desejo expressar os melhores votos de boa saúde, sucesso no trabalho a Sua Excelência o Chefe do Executivo e a todos os convidados.
Muito obrigado!
Estatísticas do Ministério Público referentes ao ano judiciário 2017/2018